Professores Débora Borges, Thiago Soares e Sabrina Moreira discutem os impactos da desinformação na era digital e a importância do jornalismo no combate das fake news
Por: Bruno Garcia Maranhão, Henrique Chiareli, João Vitor Barrozo, Roberto Vieira e Yan Linhares (alunos da disciplina de Teorias do Jornalismo, sob a supervisão do professor Rogério Borges)
As fake news tornaram-se uma das maiores ameaças à qualidade da informação em nossa sociedade. Diante desse cenário, o jornalismo enfrenta uma série de desafios, sendo a imparcialidade e a objetividade os principais pilares a serem preservados. Mas como manter esses princípios em um ambiente dominado por redes sociais, onde a velocidade da informação muitas vezes compromete a precisão? O impacto da desinformação vai além de apenas confundir a opinião pública, pois ela faz desabar a confiança no jornalismo e nas instituições, forçando uma reflexão sobre o papel do jornalista em tempos de incerteza.
As novas tecnologias trouxeram tanto oportunidades quanto ameaças. Por um lado, permitiram a apuração em tempo real e o acesso a dados mais amplos. Entretanto, por outro lado, facilitaram a proliferação de conteúdos enganosos, muitas vezes impulsionados por algoritmos que priorizam o engajamento e não a verdade. “As fake news distorcem a realidade e alimentam mal-entendidos, levando o público a tomar decisões e formar opiniões baseadas em informações falsas. Isso pode gerar desconfiança nas instituições e aprofundar divisões sociais”, alerta Thiago Soares, professor de telejornalismo e jornalismo audiovisual na faculdade Cásper Líbero.
Além disso, os critérios de noticiabilidade, que historicamente se pautaram na relevância e no interesse público, hoje convivem com a pressão pela audiência e pela viralização. O que merece destaque? A verdade ou aquilo que atrai mais cliques? Nesse contexto, o valor-notícia, tradicionalmente ligado à qualidade e à profundidade das reportagens, muitas vezes é ofuscado pelo imediatismo das manchetes sensacionalistas. Isso coloca os jornalistas em uma encruzilhada: atender à demanda por conteúdo rápido e atraente ou manter o compromisso com a apuração rigorosa e a verdade?
A Teoria do Enquadramento e a força das fake news
A Teoria do Enquadramento, um conceito essencial na comunicação e no jornalismo, nos ajuda a entender a importância da escolha das palavras, da ênfase em certos aspectos e da maneira como a narrativa é construída. Conforme explica o professor Thiago Soares, as fake news aproveitam esses elementos para manipular o público, exagerando ou distorcendo fatos para provocar reações emocionais. Elas conseguem reforçar preconceitos e direcionar o olhar do público para uma perspectiva específica e, muitas vezes, polarizadora.
Um exemplo: uma notícia que destaca o “perigo iminente” de um evento fictício pode facilmente mobilizar o medo e a indignação, gerando uma reação em cadeia. O público, em vez de buscar uma análise mais equilibrada, absorve a narrativa sensacionalista e passa a acreditar em uma realidade fabricada. É exatamente esse o objetivo das fake news, e, de acordo com Soares, esse poder de manipulação é intensificado por sua ampla disseminação em redes sociais e aplicativos de mensagens instantâneas.
O Ciclo da Polarização e o Efeito Bolha
As fake news não apenas distorcem a realidade, mas também reforçam as divisões já existentes na sociedade. A professora e jornalista Sabrina Moreira, coordenadora do curso de Jornalismo da PUC Goiás, observa que esses conteúdos são intencionalmente criados para fomentar a polarização. Eles prendem as pessoas em uma “zona de conforto”, onde tudo o que se ouve ou vê confirma suas próprias crenças, tornando o debate público cada vez mais difícil. Não é coincidência que, ao se espalharem, as fake news atinjam exatamente aqueles que já são mais propensos a acreditar nas mensagens que elas propagam.
Jornalista e professora da PUC Goiás, Déborah Borges acrescenta que a proliferação dessas informações falsas cria um ambiente onde a diversidade de opiniões é praticamente eliminada. As pessoas se fecham em suas “bolhas informativas” e, ao invés de discutir, compartilham o que já sabem e acreditam, reforçando suas visões de mundo e ignorando qualquer perspectiva alternativa. Nesse processo, as redes sociais se tornam um campo fértil para a incompatibilidade, deixando o público cego para a pluralidade da realidade.
A crise de confiança nas fontes de informação legítimas
Um dos efeitos mais preocupantes das fake news é o ceticismo que elas geram em relação ao jornalismo sério. O professor de Jornalismo Thiago Soares alerta que o público passa a questionar a credibilidade das fontes, inclusive as mais respeitáveis. “Quando o público é repetidamente exposto a informações falsas, passam a duvidar de todas as fontes, incluindo as legítimas, o que acaba com a confiança do jornalismo sério”, comenta.
A professora Sabrina Moreira afirma que esse ambiente de desconfiança é extremamente prejudicial, as fake news ao se apresentarem como “alternativas” à grande mídia, criam uma espécie de guerra de narrativas, onde o jornalismo tradicional é acusado de manipulação, e as informações informais, como as que circulam no WhatsApp, são vistas como mais autênticas.
Esse fenômeno é intensificado quando percebemos que muitas fake news são construídas com o propósito específico de desacreditar a mídia convencional. Como Déborah Borges aponta, essas notícias pintam o jornalismo sério como mentiroso e interesseiro, enquanto se posicionam como uma espécie de “voz da verdade” que supostamente não teria interesses ocultos. Essa inversão de papéis, onde a fonte confiável é desacreditada e a informação falsa ganha prestígio, tem implicações gravíssimas para o futuro do jornalismo.
O desafio do Jornalismo no combate às fake news
Para o jornalismo, enfrentar as fake news é uma corrida contra o tempo. A professora Déborah ressalta que enquanto uma fake news se espalha de forma quase instantânea, a verificação dos fatos é um processo que exige cuidado e tempo. A correção de uma notícia falsa não só demora a chegar ao público, como muitas vezes não é tão interessante quanto a própria mentira. Em uma sociedade que valoriza o impacto rápido e sensacionalista, o papel do jornalismo de buscar a verdade enfrenta barreiras cada vez mais difíceis de transpor.
A importância de uma educação midiática também se mostra fundamental. Déborah enfatiza que para reduzir o impacto das fake news a longo prazo, é essencial que o público aprenda a questionar, a analisar criticamente e a identificar informações manipuláveis. Este é um esforço de longo prazo, mas que se faz necessário para que possamos enfrentar as consequências desse fenômeno.
O esforço pela verdade
A diferença entre o enquadramento de fake news e os das fontes confiáveis reside, antes de tudo, no compromisso com a verdade e com a pluralidade. Enquanto as fake news são frequentemente sensacionalistas, simplificadoras e deliberadamente enviesadas, o jornalismo legítimo se preocupa em oferecer contexto, diversidade de vozes e, acima de tudo, precisão. Como Déborah observa: “as fake news não têm compromisso com a pluralidade e a verdade; elas são construídas com o único objetivo de reforçar interpretações específicas, muitas vezes sem qualquer embasamento factual”, afirma a professora.
O jornalismo, por outro lado, possui o compromisso de informar com precisão, respeitando a diversidade de opiniões e contribuindo para o fortalecimento da democracia. Esse é um processo que envolve apuração rigorosa, confirmação de dados e respeito à complexidade dos temas. Em um mundo onde as fake news ganham cada vez mais espaço, o jornalismo tem uma responsabilidade crucial de manter o público bem-informado, mesmo que isso signifique enfrentar barreiras cada vez maiores.