quinta-feira, 26 de dezembro de 2024
InicialNotíciaPonto de VistaReportagens

A batalha pela audiência no jornalismo brasileiro

Emissoras de TV e portais de notícias enfrentam o desafio de atrair audiência sem comprometer a qualidade e a imparcialidade.

Reprodução: Pinterest Foto: Alberto Moncada

Por Eduardo Medrado, Emanuelle Mattos, Gabriela Rezende, Gustavo Alves, Kezia Pimentel, Vitor Spindola (alunos da disciplina Teorias do Jornalismo, sob supervisão do professor Rogério Borges)

A busca por audiência é um dos principais desafios para as redações jornalísticas no Brasil. A pressão por mais visualizações, curtidas e compartilhamentos tem impactado profundamente o jornalismo no País, exigindo um equilíbrio delicado entre a necessidade de engajamento e a manutenção da integridade jornalística. O uso de ferramentas como Google Analytics e Chartbeat para medir o comportamento dos leitores em tempo real se tornou uma prática padrão nas redações, enquanto emissoras de TV recorrem a estratégias de apelo popular para se destacarem em um mercado cada vez mais competitivo.

A digitalização das redações trouxe novas ferramentas para medir o desempenho das matérias, permitindo aos jornalistas adaptar rapidamente o conteúdo com base nas reações do público. Segundo Gustavo Cruz, repórter do G1 Goiás, plataformas como o Google Analytics e o Chartbeat são essenciais para monitorar quais temas geram mais interesse. Isso facilita a escolha de pautas e a decisão de aprofundar matérias de maior engajamento. “A gente vai explorar o máximo do desenvolvimento da história, da dinâmica, seja de um acidente, de um crime ou outra coisa”, explica Gustavo. No entanto, ele ressalta que a verdade deve estar sempre à frente de qualquer decisão editorial, lembrando a necessidade de manter a ética e a veracidade, mesmo diante da pressão por números.

Um exemplo recente do impacto da audiência foi a cobertura do caso envolvendo trabalho análogo à escravidão em uma fazenda do cantor Leonardo. A alta audiência gerada por essa notícia levou o portal G1 a publicar uma série de matérias desdobrando o tema, explorando ao máximo as nuances e os envolvidos. “Vamos trazer todos os detalhes por uma questão de audiência e também de notoriedade pública, mas sem perder a ética”, destaca Gustavo Cruz. A estratégia mostrou como um tema de interesse público, aliado ao apelo midiático, pode direcionar as decisões editoriais e influenciar a duração da cobertura.

Julia Finamor, editora de Política da Globo News, com ampla experiência em coberturas eleitorais, também aponta como a audiência impacta as decisões editoriais. “A audiência mostra o interesse público, ou seja, o que o telespectador quer mais assistir. Às vezes, ficamos mais tempo no ar com um assunto por causa da audiência, mas isso não quer dizer que um tema de interesse público, mesmo sem tanta audiência, deva ser descartado”, explica. Ela ainda complementa que manter a qualidade e a veracidade das informações é essencial, lembrando que é dever do jornalista priorizar a verdade dos fatos, independentemente do apelo midiático.

Jornalismo e entretenimento

A linha tênue entre informar e entreter é constantemente debatida no jornalismo brasileiro. Julia Finamor acredita que o sensacionalismo ainda pode ser uma estratégia eficaz para atrair audiência em alguns canais, mas que essa abordagem frequentemente compromete a veracidade. “Na pandemia, por exemplo, o público procurou canais sérios para se informar e fugir das fake news por questão de sobrevivência”, observou. Essa experiência mostrou que, em tempos de crise, a credibilidade se torna um ativo essencial e o jornalismo de qualidade acaba por conquistar uma audiência mais fiel e engajada.

O jornalismo mundial está em um momento complicado. A busca por audiência é uma realidade que não pode ser ignorada, mas é necessário estabelecer limites para garantir que o conteúdo informativo não se transforme em mero entretenimento. Julia Finamor resume bem esse dilema. “A verdade deve estar sempre à frente de qualquer audiência”. O desafio é encontrar o ponto de equilíbrio entre o interesse do público e a responsabilidade social do jornalismo, preservando a integridade de uma profissão que tem como missão informar com precisão e ética.

Para Guilherme Alcântara, estudante de Psicologia de 20 anos, a motivação para assistir a um telejornal varia. “Geralmente assisto em busca de alguma notícia ou para passar o tempo na falta de algo melhor para assistir. Com certeza a audiência move a emissora, portanto acredito que ela faz de tudo em prol disso, nem que precise mudar significados da notícia ou alterar seu sentido de forma que deixe mais atrativo”, comenta ele sobre como a busca por audiência influencia as notícias.

Os perigos do sensacionalismo

Essa percepção é acompanhada de uma avaliação crítica sobre a qualidade das informações. “Dependendo dos canais a qualidade do telejornalismo altera em sua imparcialidade, linguajar e tipo de notícia a ser repassada. Um grande exemplo disso é entre Globo e outros canais, onde a Globo exige maior imparcialidade e linguagem mais formal. Para mim afeta de forma que eu procure aquele que não tenta chamar minha atenção com base em medidas desesperadas de notícias sensacionalistas”, afirma Guilherme, destacando que prefere evitar telejornais sensacionalistas por conta de suas práticas apelativas e a forma como distorcem ou exageram a realidade para atrair espectadores.

Ele também menciona que, em sua opinião, as emissoras que muitas vezes priorizam mais a audiência do que a veracidade das informações, o que afeta sua confiança nos telejornais. “No fim das contas acredito que sim, elas priorizam mais a audiência e funcionam em uma política pendular. Pendem para o lado que der mais audiência, seja ele apoiando ou sendo oposição a um partido político, por exemplo. Altera a minha confiança, me levando a pesquisar melhor sobre as entrelinhas da notícia e aquilo que aconteceu.”

Para Guilherme, o sensacionalismo também é um ponto que afeta sua vontade de assistir um telejornal. “Me sinto até irritado. Se você se deixa levar por sensacionalismos de fofocas ou violências excessivas, você passa a sentir medo demais do mundo em que vive, se tornando até mais ansioso. Isso me deixa sem vontade de assistir.” Finalmente, ele relata que já deixou de assistir a programas por conta de seu estilo apelativo. “Já deixei de assistir algumas emissoras por conta de seu sensacionalismo e foco em audiência de ‘pão e circo’ e violência. Somente mudando essa forma de contato com o público me faria reconsiderar assistir.”

Esse conjunto de opiniões reflete a dualidade que o público sente em relação ao telejornalismo brasileiro, reforçando a importância de buscar o equilíbrio entre atratividade e veracidade na produção de conteúdo noticioso. A pressão para conquistar visualizações e interações leva as emissoras a adotar estratégias que priorizam o apelo emocional e a atratividade das notícias, muitas vezes à custa da veracidade e da profundidade da informação. A busca por audiência não pode, portanto, justificar a redução dos princípios éticos que orientam o jornalismo, pois a confiança do telespectador e a qualidade das informações são fundamentais para a missão da profissão.